quarta-feira, 23 de setembro de 2009

"O Desenvolvimento Local é muito mais uma atitude cultural que um conjunto de projectos" [Goulart Carrinho]

1.Em vésperas de dar início à implementação de um novo Programa de Apoio ao Desenvolvimento Rural (ver páginas 33/34/35), quisemos trazer para “grande tema” do presente número da VIVER, a questão sempre polémica dos dinheiros (Fundos) da Europa para apoio ao financiamento do Desenvolvimento Rural do País e cá da BIS.

Dizemos – “questão sempre polémica”,mesmo tendo consciência de que, infelizmente, são muito poucos os que se interessam seriamente pelo assunto. De resto, ao que nos é dado observar, “interessar-se seriamente por um qualquer assunto” não é coisa que agrade à maioria das pessoas, sejam elas rurais ou urbanas. Entre nós, é muito mais comum “mandar bocas” sobre tudo e mais alguma coisa, mesmo sobre aquilo a que nunca prestamos atenção.

Ouvem-se sobre a questão dos “dinheiros da Europa” muitas “bocas” e poucas opiniões fundamentadas em conhecimento real do assunto: – “é uma vergonha, um regabofe, é só para os amigos, é só para pagar uns quantos tachos, quem precisa não vê nenhum, etc. etc., ou – é tudo fantasia, só promessas, querem é “lixar-nos” a vida obrigando-nos a ficar com dívidas aos Bancos, andam todos ao mesmo…”

Estas são algumas das “vozes” mais recorrentes. Quem já foi ajudado cala-se, até faz questão de que não se saiba.

Quem já tentou e não conseguiu, sem querer saber da razão, reage maldizendo do “sistema e daqueles que são julgados os “donos” do dinheiro”… é natural.

Cada pessoa é que sabe por que reage da maneira que o faz, porém, acreditamos que a maioria não sabe até que ponto é verdadeiro aquilo que julga saber; não é fácil, nem natural, ter-se a exacta noção da própria ignorância. O desconhecimento sempre foi causa de grandes incompreensões e conflitos. Por isso, aqui estamos, à procura de mais conhecimentos para melhor nos podermos entender.


2.
Ainda há por cá quem pense que os fundos europeus se destinam a ajudar os pobrezinhos! Que o orçamento da União Europeia (U.E.) é uma espécie de caixa de esmolas! Nada mais errado. A aplicação dos dinheiros da Europa, dos dinheiros provenientes dos impostos pagos pelos
cidadãos da Europa, portanto também por nós portugueses, tem de ser feita com regras, regras muitas vezes demasiado complicadas e pouco perceptíveis para aqueles que são os mais interessados na sua utilização, mas regras às quais os Países membros da União, as Instituições públicas e privadas e as pessoas, têm de obedecer, sob pena de serem julgadas e punidas pelos seus actos.


3.
À luz da experiência destes quase 20 anos a servir de intermediária na gestão de programas europeus de apoio ao desenvolvimento rural, a ADRACES está convicta da enorme
importância destes programas para ajudar a diminuir o ritmo do despovoamento e da degradação ambiental do nosso território.

Sem o apoio dos fundos afectos aos diferentes programas utilizados, sem o trabalho de tanta gente sinceramente devotada a este combate, a situação económica e social da BIS e do País seria extremamente pior.


4.
Como em todas as situações e actividades humanas, teria sido possível aproveitar melhor os fundos que foram atribuídos ao País, se tivéssemos uma Administração Pública juridicamente configurada de outra maneira, mais descentralizada, mais próxima das necessidades e limitações de cada território local concreto.

A elaboração de políticas de âmbito nacional aplicáveis da mesma forma a todo o país, a apreciação mecanicista e centralizada dos projectos sem ter suficientemente em atenção as características dos territórios da sua aplicação, limitou o impacto de muitas dinâmicas locais conseguidas quase sempre à custa do trabalho persistente de autênticas devoções às causas do desenvolvimento das suas “terras” de nascença ou de opção de vida.


5.
Mas… nós todos, também os que destas ajudas não necessitamos ou pensamos não necessitar, temos neste assunto a nossa parte de responsabilidade. De uma maneira demasiado generalizada, desinteressamo-nos a todos os níveis de participar das discussões e negociações,
locais, regionais, nacionais e europeias, onde estes assuntos se debatem. Como em tantas outras coisas, deixamos comodamente que os outros pensem e decidam por nós, depois cá estaremos para os julgar! Mas será tarde… é sempre tarde, quando descansamos à espera do resultado
do trabalho dos outros.

Pela nossa parte, procuramos participar e acompanhar, sempre que possível, os momentos em que se discutem as questões que a todos nos dizem respeito. Da vida de uma Colectividade Local até às magnas reuniões europeias, passando por uma Junta de Freguesia, ou por uma reunião regional ou nacional, sentimo-nos no dever e com a obrigação de dizer aquilo que pensamos e de escutar o que os outros pensam. Nos próximos dias lá estaremos em Berlim para participar no início das discussões sobre a definição do próximo orçamento da União.

O Director
António Realinho



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Os "Dinheiros da Europa", nós e o Desenvolvimento da BIS

Dedicamos este número à reflexão sobre um tema que, em tempos de “vacas magras” como o que estamos vivendo, se torna assunto recorrente de todas as conversas.

Como é costume dizer-se “a necessidade aguça o engenho”.

Concordamos. Mas, a necessidade extrema… pela angústia que origina, é má conselheira!

Ouvem-se, como sempre, a propósito da aplicação e aproveitamento dos “dinheiros vindos da Europa”, portanto também vindos daqui mesmo, desta Europa que também somos, as mais diversas opiniões: umas razoavelmente fundamentadas, outras, autênticos disparates típicos das conversas de papagaios repetidores para passar tempos vazios.

Infelizmente, poucos são aqueles que, conhecedores das normas e práticas de aplicação dos financiamentos públicos nacionais e europeus, se dão ao trabalho de as dar a conhecer e explicar.

Quem já alguma vez recorreu ao apoio destes “fundos” sabe das dificuldades que a sua utilização por vezes ocasiona. A ilusão configurada por aquele velho aforismo de que “a cavalo dado não se olha o dente” não corresponde minimamente à realidade. Com os dinheiros vindos da Europa, não há cavalo dado! Na maior parte dos casos, é preciso pagar do bolso próprio metade do animal, ter a carroça e garantir a ração e a palha para que ele não morra, de contrário “vai tudo por água abaixo”.

Na ADRACES, que tem vindo a gerir a aplicação de alguns escassos fundos provenientes da U.E., segundo planos e regras previamente estabelecidas e aprovadas pelos organismos centrais e regionais do nosso País, conhece-se bem quanto custam as ditas comparticipações e os “desfasamentos”no cumprimento de compromissos assumidos pelas autoridades de tutela.

Senhores desta experiência de quase 20 anos, continuamos a pensar que o trabalho de Desenvolver (desembrulhar?) as pessoas que residem e labutam no território objecto da nossa acção tem que passar por uma pedagogia de resultados necessariamente lentos de “educação para o desenvolvimento”a que alguns chamam de “mudança de mentalidades”.

Esforçamo-nos por cumprir esse objectivo estratégico. A VIVER, sendo parte integrante desse trabalho, transcende a dimensão regional, atraindo, de fora para dentro, competências, vontades e meios indispensáveis ao alcance dos nossos objectivos.


“INTELECTUAIS”?

Alguém, a quem lamentavelmente não podemos agradecer por ter querido guardar o anonimato, critica-nos, elogiando-nos.

Dizendo que estamos intelectualizando-nos.

O essencial da questão é que, para o bem e para o mal, é a maneira de usar o intelecto para prever e planificar o que distingue os Humanos das outras espécies.

A evolução da Humanidade assenta, não só mas essencialmente, no aumento progressivo da utilização do intelecto.

Por isso, não nos parece lá muito coerente pensar que o “desenvolvimento” da BIS, ou de outro qualquer território, se possa fazer sem que as pessoas que nele habitam aumentem progressivamente a sua “capacidade de compreender” a sua inteligência.

Sem que as pessoas sejam estimuladas a usar O INTELECTO como usam as pernas, as mãos, os ouvidos e/ou os olhos, sem esquecer obviamente o coração… a começar por nós próprios, não há evolução, estagnamos e acabamos matéria inerte.

Esta é a essência nuclear da acção de “Desenvolver”.

Conservando os sentimentos inerentes ao amor, à paixão e à solidariedade, esforcemonos por compreender melhor, não só a BIS como o Mundo. Sejamos mais inteligentes, intelectualizemo-nos! Sim, aqui na VIVER, fazemos por isso.

O Editor
Camilo Mortágua



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Balanço das Europeias 2009 na Europa


Os cidadãos dos 27 países-membros da União Europeia elegeram 736 representantes no Parlamento Europeu. A abstenção nas eleições europeias de 2009 (cerca de 60%) voltou a vencer com maioria, reflectindo o descontentamento e/ou descrédito dos povos europeus em relação às políticas actuais da União Europeia.
As projecções para as eleições ao Parlamento Europeu apontam para uma vitória dos partidos conservadores que formam o grupo do Partido Popular Europeu/Democratas Europa (PPE-DE) e uma derrota dos socialistas, que sofreram fortes baixas em alguns países.
Não obstante, os três grandes partidos capitalistas sofreram penalizações. Partido Popular Europeu, Partido Socialista Europeu e Liberais – todos eles em conjunto sofreram uma forte redução de deputados, perdendo 97 euro-deputados.
A Esquerda europeia perdeu como era mais ou menos previsível o grupo parlamentar italiano (maior do grupo GUE-EVN com 8 euro-deputados). No entanto, a esquerda europeia manteve alguma firmeza (com 33 deputados face aos 41 que tinha até agora).
A Aliança Liberal-Democrata pela Europa (Alde), terceira maior força, sofreu leves perdas, seguida da bancada dos Verdes/Aliança Livre Europeia (Verdes/ALE), que conseguiram, por sua vez, pequenos ganhos. O grupo parlamentar europeu dos Verdes e Aliados registou uma subida (alcançando 53 euro-deputados face a 43 anteriores), absorvendo a maioria das subidas de votos à Esquerda (a Esquerda perdeu 8 e os Verdes ganharam 10).
Basicamente, a divisão de poder no Parlamento não foi modificada. A diferença entre a bancada conservadora e a do Partido Socialista Europeu (PSE), segunda maior força no Parlamento, aumentou.
Há ainda que ressalvar a ascensão dos movimentos de extrema-direita por toda a Europa, como um aviso sério às fragilidades das democracias implantadas. Os partidos desta natureza conseguiram 30 euro-deputados a mais.


Grupos e partidos políticos
Os deputados ao Parlamento Europeu estão agrupados por famílias ou grupos políticos, e não pela respectiva nacionalidade. Existem sete grupos políticos representados no Parlamento Europeu:
Grupo do Partido Popular Europeu (Democratas-Cristãos) e dos Democratas Europeus
Grupo Socialista no Parlamento Europeu Grupo da Aliança dos Democratas e Liberais pela Europa
Grupo União para a Europa das Nações
Grupo dos Verdes/Aliança Livre Europeia
Grupo Confederal da Esquerda Unitária Europeia/Esquerda Nórdica Verde
Grupo Independência/Democracia
Como os partidos nacionais, em muitos dos casos, não têm a mesma denominação ao nível comunitário, esta organização facilita o agrupamento das ideologias políticas.


Correspondências com os partidos portugueses
A correspondência dos partidos políticos europeus com os de Portugal é:
Partido Popular e Partido Social Democrata correspondem ao Grupo do Partido Popular Europeu (Democratas-Cristãos) e dos Democratas Europeus
Partido Socialista corresponde ao Grupo do Partido Socialista Europeu
Coligação Democrática Unitária (PCP-PEV) e Bloco de Esquerda correspondem ao Grupo Confederal da Esquerda Unitária Europeia/Esquerda Nórdica Verde

Informação retirada dos seguintes sites:
http://pt.wikipedia.org
http://www.europarl.europa.eu
http://www.dw-world.de
http://revolucionaria.wordpress.com

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sexta-feira, 8 de maio de 2009

Fé e ruralidade, um casamento tradicional em processo de extinção?



O Director
António Realinho


Nas Comunidades Rurais, ainda hoje, graças à idade da maioria das suas populações, prevalece de maneira bem generalizada a crença de que tudo quanto acontece neste mundo corresponde à vontade de DEUS.

Se a vontade de Deus é que soframos a CRISE, - “seja feita a sua vontade e seja o que Deus quiser”- por isso, as reacções dos rurais às dificuldades da vida sempre foram mais condescendentes, mais resignadas, mais crentes na impossibilidade de se opor aos divinos desígnios.

Com a entrada de “pregadores” de muitos credos e cores casas a dentro das famílias rurais, através da rádio e da televisão, a situação vem-se alterando mas, por paradoxal que pareça, esta “pregação”de alguns dos mais ambiciosos aspirantes a Deuses, por falaciosa, trapalhona e enganadora, tem contribuído para diminuir a confiança nos homens e reforçar a fé em DEUS.
Num Deus, nem sempre o mesmo, mas sempre Ente Supremo justo e bom, reinando com imparcial rigor sobre os destinos de todos nós, nunca sujeito às pressões dos mais poderosos em prejuízo dos mais humildes e ou oprimidos.

É esta Fé feita da sublimada obediência à omnipotência de Deus que concorre para minorar o sofrimento e alentar a coragem das comunidades rurais, permitindo-lhes enfrentar esta e todas as crises da vida com maior serenidade e esperança.

Graças à crise e ao tratar deste tema, pude usufruir do raro privilégio de escutar atentamente, e ficar a melhor conhecer, três personalidades de excepção, cujas vidas, por diferentes razões, são dignas de nelas atentarmos como exemplos da dedicação e persistência devotadas às suas causas (às suas fés).

Foram eles:
O Senhor Bispo de Portalegre e Castelo Branco, homem de Fé em Deus mas também nos Homens com quem se sente solidário quando estes não se perdem na ambição de deixar de ser humanos, pretendendo alcançar a essência do divino. Homem atento e de lúcida compreensão para os problemas das pessoas, sejam elas crentes ou não.

O Senhor Professor António Martins da Cruz, Reitor da Universidade Lusíada, extraordinário exemplo de Beirão e Pedagogo, educador emérito, impulsionador de novas abordagens baseadas em princípios e métodos fundados na assunção da responsabilidade inerente ao usufruto da Liberdade, ideias e teses com que tem vindo a influenciar positivamente sucessivas gerações de estudantes, ao longo de toda uma vida dedicada ao ensino superior.

O Senhor José Ribeiro Henriques, fundador da CENTAURO. Neste homem, de origem humilde e rural, encontramos bem patentes as características próprias das pessoas moldadas por tenazes e persistentes combates pela vida. Dessas pessoas que, sem grandes condições à nascença, não se resignam à pobreza do berço e, pragmaticamente, vão à vida, dela fazendo a sua riqueza e a sua realização pessoal.

À visão estratégica e ao engenho e arte deste homem, ao seu espírito empreendedor e disponibilidade para a inovação tecnológica, devemos (a economia Da BIS, da região e de Portugal), a grande empresa internacional que é hoje a CENTAURO
e, para além dela, o desenvolvimento e credibilidade da industria do frio em Portugal.


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A nossa Fé…



O Editor

Camilo Mortágua


Ser Editor não é ser “fazedor” dos conteúdos duma revista. O Editor está para a revista como o médico está para a criança nascida de cesariana. Cuida de A dar à luz do vosso interesse e possível admiração, mas obviamente não lhe compete o prazer e esforço da sua fecundação, essa é uma tarefa que desejamos partilhada pelo maior número possível de “Pais”.

Mesmo assim, este número, embora à partida se antevisse “um parto difícil”, deixou-nos a satisfação própria dos projectos bem sucedidos. O grande tema escolhido – “A Crise e a Fé” revelou-se suficientemente apelativo para interessar um diversificado leque de pessoas a participar da sua “criação”.

Toda a equipa está satisfeita e agradecida a quantos contribuíram para esta entrega que agora vos fazemos. Estamos convencidos que a decisão de nos ler será compensada pela satisfação de se sentirem mais conhecedores das diferentes formas de pensar de muitas das pessoas que nos rodeiam e que são detentoras de responsabilidades e poderes que, de uma ou de outra forma, têm que ver com as nossas próprias vidas.

É deveras gratificante poder contar com a dedicação e inteligência dos colaboradores que nos honram com o seu trabalho.

Voltamos a inserir a rubrica “ Inovadores e Pioneiros”, para poder preencher uma lacuna até hoje em aberto, reconhecendo o mérito daquele que talvez mereça a distinção e o título de “Pioneiro de todos os Pioneiros da BIS” – José Ribeiro Henriques, fundador da CENTAURO.
Também inserimos nas páginas deste número, na “Tribuna da Cidadania”, uma entrevista com uma personalidade natural da BIS, de há muito pensada, Homem de extenso percurso cívico e conceituada e reconhecida competência ao serviço da educação superior em Portugal e não só, o Prof. Doutor. António Martins da Cruz, reitor da Universidade Lusíada.

Pela oportunidade de conhecer o pensamento do novo Bispo de Portalegre e Castelo Branco, neste tempo de angustiantes incertezas morais e materiais, entendemos ser importante atentar nas suas palavras, para melhor compreendermos a pluralidade de pensamento duma instituição como a igreja católica.

Por tudo isto, gostaríamos que o conjunto destas páginas não constituísse “mais uma revista”. Pretendemos que cada número da VIVER constitua um documento que se guarda, como coisa de culto, e ao qual se volta sempre que nos vem à memória um assunto nela tratado. Talvez seja demasiada pretensão da nossa parte, mas é com esse objectivo que, número a número, cuidamos de a “dar à luz” o mais limpinha e sã possível.


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sexta-feira, 27 de fevereiro de 2009

O Novo Ano

Sendo este o primeiro número de dois mil e nove, quero endereçar a todos os considerados leitores da VIVER votos de sobrevivência sem danos maiores, neste novo ano que todos nos anunciam como extremamente difícil.

Esperemos e façamos, uns e outros, tudo o que for necessário para manter e oferecer a quem nos rodeia, se mais não puder ser, pelo menos, um sorriso…

Discursos piedosos, por mais corajosos e verdadeiros que sejam, não devolvem facilmente o optimismo perdido. Enquanto outras soluções não forem encontradas, transformemos os nossos discursos em acções concretas de solidariedade com quem precisa. Sejamos solidários. Demonstremos que “ser português” também é, para lá da retórica, pertencer a uma família que se entreajuda.

Sabemos bem que, pelo menos em parte, também são portugueses alguns dos iluminados da finança (praticantes do capitalismo de casino) causadores destes maus momentos que estamos a viver… os corações revoltam-se e as nossas mentes clamam por justiça. Porém, o mais urgente é cuidar dos vivos – como diria o Marquês. Aqui pela BIS, honrando as mais nobres tradições beirãs, vamos estar atentos às dificuldades alheias, vamos unir-nos para melhor resistir, vamos demonstrar que estas terras são terras de acolhimento nos bons e nos maus momentos.

Façamos tudo para que, pelo menos por aqui, na BIS, as portas se abram a quem precisa, e o calor dum gesto amigo transforme a dádiva em solidariedade, nunca em esmola. Que cada um de nós esteja atento à sua volta, que ninguém seja ignorado. Que os constrangimentos sentidos pelos “novos pobres” em demonstrar a sua pobreza, não nos deixe indiferentes.

Que a crise seja transformada numa oportunidade para proclamar a bondade de viver numa terra solidária. São estes os nossos mais sinceros e veementes apelos.


Ano novo, “vida nova”

Iniciamos com este número a segunda série desta publicação. Com um “visual” diferente, mas obedecendo aos mesmos princípios e objectivos que, desde o início, nos têm orientado.

Compete-me assumir por inteiro a decisão desta mudança ditada exclusivamente pela vontade de experimentar fazer diferente, de encontrar na possível diversidade de estilos, novas oportunidades de satisfação de diferentes sensibilidades.

A toda a equipa que produziu os primeiros dez números da primeira série, envio as minhas felicitações pela excelente qualidade do trabalho realizado.

Aos que agora iniciam a sua colaboração, desejo que possam retirar do futuro trabalho conjunto as maiores satisfações pessoais e profissionais; aos que permanecem, manifesto o meu desejo de que continuem a dar à VIVER toda a dedicação, competência e empenho que até agora têm demonstrado.


Os nossos Parceiros

Por último, dirijo-me aos primeiros, ou seja, aos Parceiros da ADRACES, membros da Parceria para o Desenvolvimento da Beira Interior Sul – BIS (objecto do grande tema do presente número) manifestando-lhes, uma vez mais, a disponibilidade da VIVER, para apoiar os trabalhos da Parceria e sustentar, na medida das nossas possibilidades, a dinâmica das suas acções.

Boa saúde para todos.

António Realinho
Director




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A CRISE…A CRISE…A CRISE…A CRISE?

I

- SERÁ QUE ELA É CEGA, MAS VÊ, SEM QUE A GENTE SAIBA PORQUÊ? Assim como dizem que o amor é?

E se assim for, de quem é que ela se desvia, a quem é que ela ataca em primeiro lugar?

Vai tocar a todos, dizem! – E se, de repente, todos ficássemos desempregados? Como iríamos sobreviver?

Pode-se viver sem emprego, mas não se pode viver sem comer… não é? Só que para poder comer, por agora, é preciso ter dinheiro para o comprar. Ou talvez não. Desempregados, podíamos ter tempo para produzir o que comemos, com um bocadinho de terra, de água e sol, e vento e sombra, e umas quantas mãos cheias de bosta; podíamos arranjar com que nos alimentar e ocupar o nosso tempo de desempregados… bom, é melhor nem pensar… é muito complicado, tudo isso.

As “altas individualidades” das macro-ciências sociais, económicas e políticas estão procurando, e, como no passado, encontrarão as melhores soluções para combater a maligna!

Ocupemo-nos da VIVER e da VIDA cá pelas nossas veredas da Raia, imitemos as formigas e, com a ajuda de todos os Santos e Virgens cá da BIS, havemos de ter comidinha para passar o Inverno da CRISE.

Se soubermos ser como as formigas, mesmo morrendo muitos, sobreviveremos!

II

Como disse o poeta cantor naquela canção que muitos de vós conheceis (se não conhecerem vão à “NET”) – “O MUNDO É FEITO DE MUDANÇA”. Como fazemos parte do Mundo, também decidimos contribuir para a mudança. Serão vocês, anónimos e estimados leitores, a dizer de vossa justiça.

Outra canção, esta menos conhecida e mais antiga, dizia assim: “Para melhor…está bem, está bem. Para pior, já basta assim”. Estaremos atentos ao sentido dos vossos “cantares.”

III

Como podem verificar, este número está dedicado aos Parceiros e à Parceria para o Desenvolvimento Rural da BIS.

Daqui saudamos todos, os que já são, os que gostariam de ser mas ainda ninguém os convidou, e mesmo aqueles que não se interessam por estas coisas e têm mais que fazer, porque não se pode perder tempo, que a vida está difícil…

Nós, aqui na VIVER, também temos mais que fazer, mas nada mais importante. Por isso, aqui deixamos o convite a que nos convidem para também sermos parceiros. Se nos aceitarem, prometemos aportar-vos desassossego e inquietações suficientes para que a Parceria não adormeça nem desapareça perdida no limbo do esquecimento.

Esta revista, que já é vossa, pode ser mais e melhor usada pelos parceiros, tomem a iniciativa, que nós cá estaremos para corresponder aos vossos apelos.

Camilo Mortágua
Editor




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Sobre PARCERIAS


CM
Foto: Pedro Martins

Uma das grandes dificuldades para o correcto funcionamento de uma parceria, talvez mesmo a maior, a necessitar de contínuo trabalho e grande experiência, é a de transformar as naturais e legítimas contradições de interesses, em contradições de dinâmica positiva e convergente.

É por isso que pretender meter tudo no mesmo saco; imaginar que é praticável confundir uma parceria de âmbito sub-regional com uma parceria efectivamente local; imaginar que representantes da Administração Pública e os dirigentes e técnicos das organizações da Sociedade Civil estão preparados e têm condições objectivas para trabalhar em parceria; apregoar voluntariosamente a criação de PARCERIAS, desinteressando-se da formação dos parceiros; exigir a apresentação formal de listas de parceiros sem ter a possibilidade material de verificar porque processo de participação/formação é que se adquire essa qualidade; exigir retoricamente qualidade, autenticidade e transparência no funcionamento das parcerias, sem afectar a cada uma os recursos indispensáveis ao justo pagamento do trabalho que a assistência e dinamização duma parceria implicam; é…, para todos os efeitos práticos, a demonstração evidente de que quem concebe e enquadra políticas e programas baseados em PARCERIAS não acredita na possibilidade de serem cumpridas as exigências qualitativas que faz, aceitando, por vezes, a sua defeituosa ou perversa existência, sem consequências para os “fingidores”, gerando-se assim uma tácita cumplicidade entre controladores e executantes, baseada em sub-entendidos que permitem que a maioria das PARCERIAS existentes não passem de PARCERIAS DE PAPEL.


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Trabalhos Ciclópicos


António de Abrunhosa
AFLOBEI - Associação de Produtores Florestais da Beira Interior


A agricultura não parece ser o futuro desta região. Mas, como a indústria o é cada vez menos e não se pode povoar uma região só com funcionários públicos, talvez se tenha de voltar a pensar na agricultura. Desde logo, porque o povo não desapareceu, apenas abalou para onde se come muito mas não se faz comida (não nascem couves no Colombo). E, depois, porque o que se come lá e não se faz cá, de algum lado virá e alguém o pagará. Foi mais ou menos a pensar nisto que os criadores da Comunidade Europeia inventaram a política agrícola comum. E, ainda hoje, os países mais desenvolvidos da Europa e do mundo têm poderosos sectores agrícolas. E se a coisa fazia sentido nos anos 50 quando os Chineses estavam longe do bilião e viviam felizes com uma malga de arroz por dia, faz muito mais sentido hoje quando 3 biliões de pessoas, que vivem para lá do meridiano que passa em Izmir, se habituaram já a comer frango e borrego ou porco e vaca ao almoço e ao jantar.

[…]

Na Beira Baixa já não vamos a tempo de relançar uma agricultura produtiva de dimensão nacional depois da destruição pelo presente Ministro do último grande ciclo de investimento permitido pelo tabaco que teria sucedido aos do trigo e do tomate. Resta-nos salvar produções especializadas de alta qualidade e revitalizar o meio rural com todas as contribuições que este traz a uma população cada vez mais imersa nos programas do Goucha ou nos Buzz das playstations.

É uma tarefa ciclópica em sentido literal, porque já só temos um olho (o outro já ficou em Bruxelas) e o dinheiro quase não dá para mandar cantar um cego.


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Cooperar para Desenvolver


Domingos Santos
Docente do IPCB – Instituto Politécnico de Castelo Branco


No decurso de um trabalho em que colaborei, tive oportunidade de conhecer um empresário da região que, sem ponta de ironia, afirmava basear a sua conduta no chamado código de ética do ilusionista:


“Não dizer o que se faz;
Não fazer o que se diz;
Dizer o que não se faz;
Fazer o que não se diz”.


Este episódio parece-me constituir, em boa verdade, uma metáfora bem ilustrativa de alguns dos desafios que enfrenta o mundo rural. Em grande parte do universo empresarial e institucional mais tradicional prevalece ainda esse espírito de solidão e de secretismo pouco esclarecido, de quem não percebeu a mudança e o significado dos novos tempos e dos novos desafios. A verdadeira grande ilusão é continuar a perspectivar as estratégias de inserção na economia-mundo como se tudo resumisse ao velho chavão de que o segredo é a alma do negócio! Se os agentes mal se dão a conhecer, como podem criar laços de confiança que são o fermento de qualquer projecto de cooperação?

[…]

A interacção de carácter cooperativo e estratégico é, a este nível, um instrumento fundamental. No fundo, a globalização torna ainda mais premente a necessidade de os actores locais se dotarem de planos e estratégias para se reposicionarem às escalas nacional e internacional. É importante que os territórios se abram ao mundo, mas de forma organizada e inteligente. Diferenciada. O mais importante para as comunidades locais é crerem em si próprias. Sem esta confiança nos seus recursos, na sua inteligência, na sua energia, nenhuma alcançará o sucesso a que aspira.

[…]

Persiste, em Portugal, a lógica paternalista de que cabe ao Estado central representar o mundo rural nos processos de negociação, onde, por razões que são de todos conhecidas, existe um manifesto défice de capacidade reivindicativa. Mais descentralização, mais confiança nos diferentes actores locais, mais regulação institucional e maior conhecimento das realidades locais e regionais seriam caminhos seguramente mais eficazes e democráticos para o desenvolvimento rural integrado e participado.


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