sexta-feira, 31 de outubro de 2008

Liberdade… para ir e vir… para entrar e sair Paz… para poder ficar


“O sinal mais eficaz para medir a verdadeira estatura democrática de uma Nação moderna consiste na avaliação do seu comportamento para com os imigrantes.
(João Paulo II, discurso em Guadalupe)


Emigrantes são os que de cá saem. Imigrantes são os que para cá vêm. Ouvimos muitas vezes dizer – “Os nossos emigrantes” – instintivamente, os emigrantes são nossos, e os imigrantes que cá estão, são os emigrantes dos outros!E os que sempre por cá estiveram, que são? Não seremos também migrantes… Duma outra qualquer classificação?Porque será que o (e) de emigrante e o (i) de imigrante, a diferença duma simples letra, provoca tantas e tão pesadas consequências nas pessoas duma e de outra situação?

Ao fim e ao cabo, não seremos todos migrantes de passagem entre os hipotéticos céus e infernos, entre a vida e a morte, entre o lugar de nascença e o buraco onde a terra recuperará a matéria de que o nosso corpo é feito?Que me perdoem @s leitor@s, mas, possivelmente, todos vós tereis passado por momentos como este em que vos escrevo a anunciar o aparecimento do nº 10 desta revista. Momentos em que, apesar do imediatismo das tarefas quotidianas que nos esperam, não nos podemos impedir de parar para pensar no sentido da nossa passagem, da nossa migração por este mundo!

De facto, partilhar informações, toda a gente diz fazê-lo: conseguir partilhar sentimentos é mais difícil. Porém, confio na vossa tolerância e na cumplicidade que já vamos gerando ao fim destes 10 números a falar de assuntos bem diversos, para tornar possível a mútua satisfação de nos sentirmos mais ricos e humanos após nos termos deixado interessar pelas sugestões de pensar e interiorizar, em comum, diferentes raciocínios sobre as mesmas coisas, mas sempre convergindo sobre os parâmetros fundadores da nossa identidade regional e nacional, no contexto territorial da BIS.

Bem. Neste número falaremos essencialmente de migrações. Não se trata de um qualquer estudo estruturado sobre uma das possíveis abordagens do tema.Convidamos pessoas, interessadas e mais ou menos conhecedoras do presente e dos passados recentes das migrações que fizeram e fazem parte, pela ausência ou pela presença, do nosso viver comum.

Falamos com pessoas de muitas condições e procedências a quem solicitamos as suas opiniões, opiniões que aqui vos deixamos, com o propósito de, se possível, alargar e aumentar a vossa e nossa compreensão sobre o que significa protagonizar as diferentes situações decorrentes das diversas formas de ser migrante, e sobre os problemas concretos que afligem as migrações de hoje.

Trazendo mais este tema a reflexão e debate, penso estarmos a cumprir com um dos principais objectivos inicialmente propostos para esta revista: “o de estimular-nos mutuamente a exercitar o nosso cérebro”, procurando compreender o mundo que nos rodeia, para podermos ser mais eficientes e competentes em defesa dos nossos interesses individuais e colectivos e da imagem e do progresso da BIS, nosso território de origem e/ou opção.

Para conseguirmos sentir que estamos a progredir no bom caminho, a partir de agora, procuraremos relacionar-nos com aqueles que à nossa volta são os nossos “conhecidos” desconhecidos. Dirigir-se a um migrante é fazê-lo sentir-se alguém igual a nós; só não entende a importância do gesto quem nunca viveu sozinho em sociedade alheia.

António Realinho
Director da ADRACES

Migrações: A sua importância para o Desenvolvimento da BIS


1. Em quase todas as aldeias e vilas da BIS, há famílias que vivem ajudadas pelos migrantes. Pelos seus que emigraram e vão mandando alguns euros para completar as magras reformas, ou pelos que para cá vieram e ajudam os idosos que ficaram nos trabalhos que faziam os que partiram!Em quase todos os lugares da BIS, dos mais pequenos aos maiores, há comércios abertos, sobretudo cafés e pequenos super-mercados, criados por ex-emigrantes. Comércios e lugares que ajudam a animar as pequenas terras e a diminuir a aceleração do seu despovoamento.

2. Muitos dos líderes e activistas mais dinâmicos das colectividades locais, culturais e desportivas, ganharam essa sensibilidade e experiência, esse gosto pelo trabalho associativo, nas associações das comunidades portuguesas da emigração, estimulados por um certo e inconfessado “peso de consciência” por ter abandonado a Pátria. Lá fora, participar na “Associação portuguesa” é uma forma de sentir a Pátria perto de si; uma maneira de compensar o sentimento de ausência e de se sentir mais seguro entre iguais. Por isso, quase todos os nossos emigrantes, de uma forma ou de outra, são activistas associativos!

3. Entre os mais esclarecidos autarcas da BIS, muitos foram emigrantes e ganharam lá fora, em contacto com sociedades democraticamente mais evoluídas e consolidadas, o gosto pela actividade política, pela gestão da vida pública e pela participação cívica.

4. Há quem estime em mais de 500 mil o número de pessoas, naturais da BIS, que se sentiram compelidos a emigrar para poder sobreviver com alguma dignidade e conforto, ao longo dos últimos 50 anos. Em parte, o impacto negativo dessa hemorragia demográfica está bem visível na nossa paisagem rural, embora para a situação actual tenham contribuído outros factores de política interna.Este é sem dúvida o nosso maior “prejuízo”; mas, as migrações, nunca são só prejuízos ou ganhos. Há sempre desvantagens e vantagens.Os ganhos culturais e tecnológicos, científicos e empresariais, obtidos pelas pessoas que emigraram, nunca teriam sido possíveis com os nossos costumes e meios. Também os trabalhadores emigrantes, a todos os níveis, têm feito e estão fazendo os seus “ERASMUS”. E isto é um incalculável benefício a ter em consideração.

5. Os contributos das migrações para o Desenvolvimento da BIS, positivos e negativos, têm sido contributos auto-decididos e sem nenhuma ou muito pouca intervenção dos responsáveis pela governação da BIS e/ou do País. Parece-nos indispensável mais “pedagogia activa” para motivar maiores benefícios. Nós limitamo-nos, na medida das nossas possibilidades, a procurar contribuir para que o tema mereça maior atenção da parte dos poderes públicos e da sociedade civil organizada locais, a fim de podermos evoluir para outros patamares de acção pró-activa e muito menos passiva, ou neutra, em relação à optimização dos resultados que, para a BIS, se podem obter dos movimentos migratórios do presente e do futuro. Esta a razão essencial para trazer a conhecimento público opiniões e depoimentos sobre o tema.


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... E vão dez


Com esta chegámos à dezena. Para que os atrasados e/ou distraídos não se venham depois queixar, aqui relembramos os grandes temas tratados anteriormente: 1. Os velhos da raia; 2. A juventude da BIS; 3. Associações e associativismos da BIS; 4. Artes e artistas da BIS; 5. Agriculturas e agricultores da BIS; 6. Artesãos e artes populares da BIS; 7. A educação e o ensino escolar no desenvolvimento da BIS; 8. Turismo e desenvolvimento local na BIS; 9. Cooperação e desenvolvimento local – mitos e realidades; 10. Migrações, a sua importância no nosso desenvolvimento.

Temos consciência das dificuldades inerentes à concretização da nossa pretensão de fazer da Beira Interior Sul um território coeso, capaz de definir objectivos comuns, em que todos se revejam e se sintam implicados.

Estamos convictos que essa (a coesão activa) é a grande mais-valia que projectará as nossas terras e vidas para a exemplaridade governativa do século XXI, e para o alcance de mais satisfatórias condições de vida.

Para muitos, este grande objectivo estratégico, não passa de mera e ousada utopia! Utopia ou não, é esta a grande ambição da VIVER, a nossa grande motivação. Contribuir para o entendimento entre todos os interesses e protagonismos existentes na BIS. Contribuir para a capacidade de todos e cada um de nós em sacrificar algum do nosso interesse pessoal em benefício do interesse colectivo.

Por experiência, temos noção da lentidão e descontinuidade existentes na progressão dos processos de mudança social. Mudar comportamentos arreigados e interesses instalados, é como água mole em pedra dura… dura, dura… mas tanto bate até que fura!

Claro que não temos a pretensão de ter, nem sequer, a força da água mole.

Apesar disso, sentimos a obrigação de usar os meios que temos e a limitada inteligência que nos deram, para ajudar, para provocar a reflexão, para chamar cada vez mais pessoas para a prática do entendimento tolerante e activo em favor de acções comuns, cada vez mais decisivas para os nossos futuros.

Há quem, abdicando de toda a responsabilidade sobre as leis que temos, pense que não nos podemos auto-governar porque as leis deste país não o permitem, são centralizadoras e “impostas de cima”, etc. e tal.

Não se deve pensar dessa maneira, não temos nada de ficar à espera que nos “regionalizem”, que nos “localizem”, que nos “autonomizem”. Pela nossa capacidade de entendimento e pela nossa decisão e prática de agir concertadamente, somos nós que nos regionalizamos, que nos autonomizamos, sem necessidade de que alguém o decrete.

O exercício responsável da LIBERDADE também é isto!

Como alguém disse: - fazer sermões sobre a liberdade, sem se esforçar por desenvolver a responsabilidade que o seu exercício quotidiano exige, nem criar as condições prévias à possibilidade da sua existência prática, leva-nos ao Fascismo.

É para esta causa que, número a número, com a clareza de que somos capazes, fazemos e levamos até vós a VIVER… vamos lá… pela BIS!

O Editor,
Camilo Mortágua

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